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segunda-feira, 29 de junho de 2009

MENSAGEM DE FLAVIA VITAL CVI SOBRE O ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA


No projeto de lei que prevê a criação de um Estatuto da Pessoa com
Deficiência estão inseridos programas, serviços, atividades e benefícios,
muitos deles ainda concebidos através de uma visão assistencialista e
paternalista e por vezes até autoritária em relação às pessoas com
deficiência.
Este projeto de lei, resultado de várias consultas públicas ao longo
de alguns anos, como dizem seus defensores, ainda mantém em grande parte
esta atitude tuteladora, vendo as pessoas com deficiência como não fossem
capazes e com direito de fazer suas próprias escolhas, de tomar suas
próprias decisões e de assumir o controle de suas vidas.
Retira a responsabilidade prioritária do Estado de assegurar a
efetivação dos direitos humanos e fundamentais das pessoas com deficiência,
quando compartilha esta responsabilidade com a família, com a comunidade e a
sociedade.
Faculta ao Estado fazer convênios e parcerias com Instituições,
Fundações e Organizações no que toca a saúde, educação e trabalho, não
criando nenhum mecanismo de controle destas Instituições, em detrimento a
qualidade dos serviços prestados.
Não avança para garantir um ensino de qualidade para todos e nem
emprego digno às pessoas com deficiência, pelo contrário legaliza novamente
a exploração da mão de obra deste segmento, permitindo o enriquecimento
desmedido do que chamam de entidades qualificadas para intermediar.
Apesar de estar escrito que esta lei, caso aprovada, entraria em vigor
decorridos 90 dias da sua publicação, ela não é auto-aplicativa, e necessita
de várias normalizações para poder entrar em prática.
É oportuno relembrar que a proposta do Estatuto da Pessoa com
Deficiência nasceu fora da nossa representatividade.
O nome inicial do projeto de lei - que era Estatuto do Portador de
Necessidades Especiais - já é sintomático de que foi dado por pessoas que
não nos representam.
Acima disto, reflete uma atitude de proteção assistida e de separação.
Ele é uma volta ao passado quando havia a necessidade de um
instrumento com estas características para dar assistência à generalização
da situação precária das pessoas com deficiência, mas sem abrir mão da
incapacidade das pessoas com deficiência de conviver e competir com a
sociedade geral.
Nos tempos atuais um estatuto específico para nós é um contra-senso e
um retrocesso, se coloca na contramão da história.
O Estatuto é prejudicial no sentido de reforçar a imagem de inválido e
coitadinho, levando a sociedade a continuar tratando a pessoa com
deficiência como um ser desprovido de capacidade para cuidar de si.
Neste sentido, para a sociedade em geral o Estatuto da Pessoa com
Deficiência se torna a comprovação desta suposta incapacidade e constitui
uma espécie de oficialização da discriminação contra a pessoa com
deficiência, ao separar esta pessoa das leis comuns.
Desde 1981, Ano Internacional das Pessoas Deficientes, começamos a
exigir "participação plena e igualdade" de oportunidades dentro da sociedade
e não fora dela.
De lá para cá muitas ações reforçaram esta exigência.
O movimento foi autor de alguns artigos da Constituição Federal de
1988 e conseguiu aprovar inúmeras leis até hoje.
A ratifique da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência, maior demonstração de empoderamento das pessoas com deficiência
em toda história mundial dos direitos humanos.
A Convenção incorporada à legislação brasileira, ela não apenas obriga
que as leis vigentes sejam revisadas e atualizadas, mas serve de parâmetro
para que as leis futuras venham a incluir a questão da deficiência entre
seus artigos, diminuindo gradativamente a necessidade de leis específicas
para as pessoas com deficiência, separadas das leis comuns.
A partir da Convenção todas as questões relativas às pessoas com
deficiência deverão ser inseridas em leis comuns, que passarão a ser
conhecidas como leis inclusivas, levando a sociedade a perceber que a pessoa
com deficiência faz parte da população e é titular de todos os direitos
humanos e liberdades fundamentais.
Portanto, a pessoa com deficiência estará inserida dentro das leis
inclusivas, ou seja, nas leis que serão elaboradas após a Convenção ser
incorporada a nossa legislação.
Deverá ficar claro que, nessas leis comuns, a pessoa com deficiência
está incluída como titular de direito aos mesmos serviços oferecidos à
população e que serão previstas especificidades de usufruto desses serviços
somente quando às condições de uma determinada deficiência assim a exigirem.
Em tal contexto, não haverá lugar para um estatuto separado sobre as
pessoas com deficiência.
Todas as eventuais vantagens de um estatuto da pessoa com deficiência
não compensam a anulação do processo de amadurecimento, evolução e
conquistas, desenvolvido pelo movimento das pessoas com deficiência nos
últimos 30 anos, no Brasil e no mundo.

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